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Igreja de Santo António: Jóia discreta do património da Figueira da Foz

Igreja de Santo António Misericórdia da Figueira da Foz

O Convento de Santo António foi fundado em 1527 por Frei António de Buarcos, com o apoio de D. João III e de António Fernando de Quadros. Anexa ao Convento existe a Igreja de Santo António, também conhecida por Capela da Misericórdia, que foi o antigo templo do Convento (nt. atualmente sede da Santa Casa da Misericórdia – Obra da Figueira da Foz).

A Igreja de Santo António foi construída em 1536, conforme inscrição visível no lado direito do arco da capela-mor. António Fernando de Quadros, Senhor de Tavarede e homem de grande influência na região, tendo cedido os terrenos para a construção do Convento de Santo António, foi aqui sepultado, em 1540, na capela-mor da Igreja de Santo António.

Em 1580, a Igreja foi devassada por tropas de Filipe II de Espanha, que a roubaram e danificaram. Ao que parece, na raiva de encontrar D. António Prior do Crato que, segundo boatos, ali se teria refugiado (D. António Prior do Crato era filho do Infante D. Luís e neto de D. Manuel I, tendo sido um dos candidatos ao trono português durante a crise sucessória de 1580). Existe na Igreja uma lápide que não deixa esquecer este ato de vandalismo das tropas de Filipe II.

Em 1602, as tropas inglesas, em luta contra Espanha, que governava Portugal, desembarcam em Buarcos, em 7 naus, e saqueiam toda a região fazendo do Convento quartel e fortaleza. Em 1725 o Convento e a Igreja sofreram obras que lhes conferiram o atual aspeto.

A fachada exterior da Igreja, de elegante linha franciscana setecentista (1725), é marcada por um largo arco abatido, cerrado por um portão de ferro. Por cima do arco abre-se um nicho que recolhe uma bela imagem de Santo António.

Ultrapassado o portal entra-se num átrio com uma abóbada ornada com brasão real. A parede esquerda está decorada com o brasão da Misericórdia e dois painéis de azulejo alusivos a Santo António e à Figueira (desenhos da Igreja, de barcos e de pescadores).

No interior da Igreja, destaque para os azulejos do séc. XVII, para o altar-mor e altares laterais, barrocos, em talha dourada. Para além dos quadros da escola portuguesa quinhentista da capela-mor, podem apreciar-se algumas esculturas de qualidade.

Igreja de Santo António Misericórdia da Figueira da Foz placa evocativa
Igreja de Santo António Misericórdia da Figueira da Foz painel de azulejos

Os dois altares laterais e o altar da capela-mor são do início do século XVIII e provieram do Mosteiro de Santa Maria de Seiça, no Paião, tendo sido repintados e doirados por artífices de Braga em 1984.
No coro podem ver-se 13 tábuas maneiristas alusivas à vida de Santo António, eloquentemente interpretadas pelo prof. Victor Guerra (consultar a página web da Misericórdia).

Na capela-mor, observam-se as tábuas maneiristas alusivas à vida de Santo António, uma pedra com as armas dos Senhores de Tavarede e uma laje tumular de D. António Fernandes de Quadros, ali sepultado em 1540, onde se pode ler: “Cavaleiro da Ordem de Cristo…”. A parede lateral direita da capela-mor é ocupada por 4 quadros de escola portuguesa quinhentista: Santo António livra o pai da forca, o milagre da mula, a pregação aos peixes e a morte de Santo António.

Na nave existe uma capela lateral, a Capela do Senhor da Vida. Esta capela tem azulejos nas paredes, de inspiração barroca, manufaturados no século XX por artistas de Condeixa.

A capela do Senhor da Vida, tardo-renascentista, do século XVII, foi uma antiga capela funerária fundada pelo casal João Homem Frade (falecido em 1613) e Maria Cardosa de Albergaria (falecida em 1622). Na Capela do Senhor da Vida pode ver-se uma pedra tumular de João Homem Frade, datada de 1613, e um retábulo com um Cristo crucificado, conhecido pelo “Senhor da Vida”, cuja história é a seguinte:

“A imagem do Senhor Bom Jesus da Vida esteve por muitos anos recolhida e oculta em uma casa de uma família antiga d’esta Villa, tendo-a mandado vir directamente da Italia. Em 1833, pela ocasião epidémica do cholera morbus, os habitantes d’esta Villa e póvos circunvizinhos foram devastados pela epidemia, e alguém sabendo d’aquela imagem oculta vendo-se no leito da dôr e a braços com a morte pelo terrível mal, recorreo com fervor e devoção áquela imagem do crucificado pedindo-lhe Vida. O Senhor ouvio seus rogos. Outros muitos dirigem á milagrosa imagem suas vozes aflitas, e suas supplicas por tal forma foram acceites, que infinitas graças concede dando Vida a muitos; e é d’esta epocha que o nome lhe deram, que até hoje dura, do Senhor Bom Jesus da Vida”.

Foi desde então que a devoção para com esta milagrosa imagem se espalhou por toda a parte, e por tal forma, que a visital-a se apinhava immensídade de povo em romaria, na sua casa da Praça Nova, d’esta Vila, do que ainda conserva o nome da imagem. Esta propriedade passou á posse do Senr. Joaquim Pereira Pestana, nascido nesta Villa, mas residente na Bahia, imperio do Brazil, bem feitor por si e seus amigos d’esta Santa Casa da Misericordia”.

Quando este Senr, a braços com a sua vida comercial se acha acometido d’uma grave enfermidade, á beira da sepultura, de lá mesmo recorre com fervorosa devoção á imagem do Senhor Bom Jesus da Vida que na sua casa d’esta Villa se achava. O Senhor digna-se ouvil-o e salval-o d’esta enfermidade de paralysia do lado direito e em breve tempo melhora”.

O Senr. Pestana confirma esta verdade com a sua assignatura em 2 de Janeiro de 1863, offerecendo, então, a Veneranda imagem á Santa Casa da Misericordia, recomendando á Meza da mesma Santa Casa, em testemunho da sua gratidão e reconhecimento, a trasladação da imagem da sua casa para esta capela, a fim de melhor ser reverenciada e acatada, como merece, e visitada com fervor dos póvos que a ela continuamente recorrem: o que effectivamente se fez em 26 de Março d’aquele anno de 1863”.

A Igreja de Santo António sofreu sucessivas alterações, ampliações e restauros, as mais importantes das quais ocorreram em 1725 (data inscrita no arco da frontaria), 1886 e 1894. A Igreja de Santo António merece uma visita, seja pela sua beleza e antiguidade, seja pelas variadas e valiosas obras de arte que possui.

Foi classificada como IIP – Imóvel de Interesse Público em 1978 (Decreto n.º 95/78, DR, I Série, n.º 210, de 12-09-1978).

AUTOR

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Fernando Curado

Natural do Alqueidão, Figueira da Foz, Fernando Curado é um engenheiro civil aposentado, especializado em engenharia sanitária. Esteve sempre ligado a entidades públicas. Atualmente reside em Beja. Há 10 anos, assumiu estudar a história da Figueira da Foz e divulgá-la de forma sintética. Já o faz desde 2015. E está só no início.