No dia 1 de outubro de 1907, na casa de Leonor de Paula, na Rua da Misericórdia, em Buarcos, a convite de António Augusto da Gama e Carlos da Cruz Oliveira, reuniu-se um grupo de 15 amigos, todos naturais e moradores em Buarcos. Fundaram nesse dia o “Grupo dos 15 Caras Direitas”, com a obrigação do pagamento de uma quota mensal de 100 réis.
A sua primeira sede foi uma pequena casa na Rua da Misericórdia, inaugurada no dia 6 de outubro de 1907, e a sua primeira direção foi constituída no dia 11 imediato:
Presidente: Joaquim Marçal Carrega; Secretário: Carlos da Cruz Oliveira; Tesoureiro: António Augusto da Gama. Os restantes 12 fundadores foram: Joaquim Rodrigues da Silva, António Caetano Ferreira, José Feteira, António Marques Murta, José Amorim Guerra, Augusto Alves Abreu, José Baptista Soares, António Gomes Pinto, Augusto Maria Henriques, José Cardoso de Oliveira, Alberto Cardoso de Oliveira e José de Brito Romão.
Tinham diversas profissões, como comerciantes, carpinteiros, tanoeiros, caixeiros, serralheiros, farmacêuticos e sapateiros.

O Grupo Caras Direitas teve depois sede na rua Governador Soares Nogueira, cedida graciosamente pelo seu proprietário e diretor do Grupo, António Gama, seguindo-se uma casa alugada a António Queiroz Nogueira, na Rua de S. Francisco, no Teatro Trindade a partir de 1916, instalando-se em sede própria em 1928.
O primeiro estandarte do Grupo Caras Direitas foi inaugurado no dia 13 de abril de 1910, com a figura da República e a vila de Buarcos em fundo, e foi seu autor o pintor figueirense António Ferreira Piedade, um estandarte bem diferente do atual.
O nome de “Caras Direitas” ter-se-ia inspirado no grupo de conjurados que protagonizaram a restauração em 1640, parecer que se confirmaria com a primeira peça teatral escolhida, “Miguel de Vasconcelos”, traidor ao serviço de Espanha, assim como a data escolhida para aniversário do grupo, 1º de dezembro, como consta da ata nº 1, o dia do “aniversário da independência de Portugal, uma das maiores glórias da nossa Pátria”.
O Grupo foi constituído com a finalidade de praticar a “Instrução, Beneficência e Recreio”, sabendo-se que mesmo antes da sua fundação já o nome Caras Direitas aparecera associado às atividades de um “grupo de rapazes” que fundaria em 1907 o Grupo Caras Direitas.
Logo em 1907 nasceu o Rancho das Cantarinhas de Buarcos, dentro do Grupo Caras Direitas, do qual foi diretor Jorge Traqueia Bracourt, nascido em 1911, para além de presidente do Grupo e seu sócio honorário. Por sua vez, José Traqueia Bracourt, nascido em 1918, também sócio honorário do Grupo Caras Direitas, fundaria a sua Escola de Música, tocando e compondo para o Rancho das Cantarinhas, mantendo o seu teatro infantil e compondo centenas de músicas para as revistas levadas à cena.





Anteriormente, outro Bracourt, também de nome José, nascido em 1889 e falecido em 1983, foi sócio honorário do Grupo Caras Direitas.
Joaquim Romão e Augusto Puto foram os coreógrafos e os ensaiadores do Rancho das Cantarinhas, que se exibiria na Alemanha, Andorra, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos da América, França, Holanda, Hungria, Inglaterra, Itália, Jugoslávia, Luxemburgo, Mónaco, Suécia e Suíça. No Rancho das Cantarinhas as raparigas dançavam com cantarinhas de barro cheias de areia, à cabeça, cujo peso variava entre 14 e 18 kg.
Em 1908 o Grupo Caras Direitas representou 5 peças de teatro no antigo Teatro Duque, alugado para o efeito, uma pequena sala de espetáculos que se situou no local da atual Estação dos Correios de Buarcos.
Os fundadores dos Caras Direitas tinham motivações políticas, todos contra a monarquia vigente, todos republicanos, todos anticlericais, e alguns maçons, porque na Figueira existia o Centro de Propaganda Republicana José Falcão desde 31 de janeiro de 1904, e não foi por acaso que o grupo foi constituído a 1 de outubro 1907.
Recordamos que a 2 de março de 1907 fora encerrada a Universidade de Coimbra, em abril seguinte foram encerradas as Cortes e o Parlamento fechado por decreto de 10 de maio sequente. Desta forma, o Rei permitiu que João Franco governasse em ditadura, encerrando jornais (Decreto de 20-6-1907) e dissolvendo as Câmaras Municipais (12-12-1907).
Em 22 de setembro de 1907, domingo, pelas 12 horas, foi colocada na Praça 8 de Maio a primeira pedra do monumento erigido em honra de Manuel Fernandes Tomás, cerimónia presenciada por 2.000 pessoas na qual discursaram os republicanos António José de Almeida, João Pinto dos Santos, Carlos Borges, António Fontes e Mário Monteiro.

O Dr. Joaquim Jardim era o Presidente da Câmara quando esta foi dissolvida por Decreto de 19 de dezembro de 1907. Quatro dias depois tomaria posse uma Comissão Administrativa, na presença do Administrador do Concelho, Carlos da Silva Pestana, que seria nomeada por alvará do Governador Civil de 30 de dezembro. Tinha como Vogais efetivos: General Frederico Tavares Garcia, Dr. António César d’Almeida Rainha, Tenente Coronel Francisco Gonçalves Rebordão, Rev. José Augusto Esteves de Carvalho, Rev. José Augusto Alves de Moura, Adriano Alves Fernandes Águas, Adrião Alves Santiago, Carlos Rodrigues Mendes e Manuel Custódio Lontro. O Presidente desta Comissão Administrativa era o General Frederico Tavares Garcia e o seu Vice-presidente o Dr. António César d’Almeida Rainha.
Após o regicídio de 1 de janeiro de 1908 e a posterior demissão de João Franco em 4 de fevereiro seguinte, seguiu-se um governo de independentes chefiado pelo regenerador Francisco Joaquim Ferreira do Amaral. Em consequência desta alteração política, no dia 13 de março de 1908 o Dr. António Carlos Borges assumiu o cargo de Administrador do concelho da Figueira.
A Comissão Administrativa municipal gerida pelo general Garcia foi exonerada em 14 de março de 1908 e no mesmo dia o Administrador do Concelho deu posse a uma nova Comissão Administrativa (2ª- após a ditadura João Franco) dirigida pelo Dr. Joaquim Jardim, que governaria o município de 14 de março a 30 de novembro de 1908.
Terminou em 30 de novembro de 1908 o mandato da Comissão Administrativa presidida pelo Dr. Joaquim Jardim.

Seguiu-se-lhe o seu irmão, o Dr. José Jardim, também do Partido Regenerador, que presidiu a Câmara de 30 de novembro de 1908 até que foi ocupar o lugar de Governador Civil de Coimbra, no dia 27 de junho de 1910, exatamente no dia seguinte à tomada de posse do novo governo regenerador de António Teixeira de Sousa.
Quando o Dr. José Jardim ocupou o lugar de Governador Civil, em 27 de junho de 1910, foi substituído na presidência da Câmara pelo seu Vice-presidente, Rodrigo Alberto Peixoto Galvão d’Oliveira, o qual esteve à frente dos destinos do município até à revolução republicana de 5 de outubro de 1910.
A 18 de dezembro de 1910, o Governo Civil de Coimbra nomeou as novas Juntas de Paróquia e em Buarcos tomaram posse Fernando Augusto Soares, Augusto Caniceiro da Costa, António Gomes Pinto e Manuel da Silva Ribeiro, como efetivos, e António Marques Murta, José Rodrigues Bento, António Augusto da Gama, João da Encarnação Pestana Júnior e Joaquim Abreu Duarte, como substitutos.
Esta nova Junta de Paróquia de Buarcos integrava vários dirigentes e sócios do Grupo Caras Direitas, pertencendo à sua primeira direção António Augusto da Gama, António Marques Murta e António Gomes Pinto.
A 4 de dezembro de 1911 ficaram concluídos os Estatutos dos Caras Direitas, aprovados em assembleia geral de 7 de dezembro seguinte. Em 1911 o Grupo Caras Direitas criou a escola primária “O Futuro”, destinada à alfabetização dos adultos, à noite, e recebendo crianças carenciadas durante o dia. Criou ainda um grupo de teatro, e a primeira peça que encenou foi “Miguel de Vasconcelos”, revertendo a receita deste espetáculo para pagar a conta na farmácia Murta de um doente carenciado.
O lucro dos espetáculos, bailes e quermesses sempre reverteram a favor de ações de benemerência, em prol da instrução dos sócios e da restante comunidade de Buarcos.
No dia 17 de setembro de 1912 o Grupo recebeu e homenageou o Dr. Manuel de Arriaga, o primeiro Presidente da República Portuguesa, que era casado com uma figueirense e visita habitual de Buarcos e da Figueira durante a época estival.
Em 31 de março de 1913 é feita a fusão com o Sport Grupo Buarcosense, que tinha uma filarmónica, e com a qual o Grupo Caras Direitas inaugurou a sua Secção Musical em 1914.
No dia 1 de março de 1914 o Grupo Caras Direitas adquiriu em hasta pública o velho Teatro Duque pela quantia de 920 mil réis, mas o edifício estava já muito degradado.
Em junho de 1918, aquando da participação de Portugal na 1ª Guerra Mundial, o Grupo Caras Direitas realizou um espetáculo a favor das famílias dos soldados que combatiam em França. Este espetáculo foi efetuado no Teatro Trindade, pois o degradado Teatro Duque fora arrendado como armazém.
A 22 de Junho de 1925 o Grupo Caras Direitas adquiriu um lote de terreno, em 9 de maio de 1926 iniciou a construção da sua atual sede e a sua inauguração ocorreu em 6 de maio de 1928.
Curioso é verificarmos o realce que a fachada do edifício dá a uma esfera armilar encimada por uma estrela de 5 pontas, muito semelhante à bandeira da “Carbonária Portuguesa”.
De facto, teriam ligação à Carbonária alguns sócios e dirigentes dos Caras Direitas, motivo pelo qual, provavelmente, o grupo buarquense transpôs para o seu estandarte aquela simbologia.
No interior do edifício encontramos uma excelente sala de espetáculos, com 375 lugares, cujo palco foi pisado por artistas como Adelina e Aura Abranches, Alves da Cunha, Ilda e Dinah Stichini, Amélia Rey Colaço, Robles Monteiro, Berta de Bívar, Álvaro Benamor, Samuel Dinis, Camilo de Oliveira, José Viana, Mário Santos, Raul Solnado e outros.
E foi num camarim desta sala de espetáculos que nasceu o popular e saudoso ator Camilo de Oliveira em 23 de julho de 1934.
Ao longo da sua existência, a secção cénica do Caras representou centenas de peças de teatro, desde dramas, comédias, farsas, operetas e revistas. As revistas predominaram, destacando-se entre as de maior sucesso: “Caldeirada à Pescador”, “Nortada Rija”, “Onda Marítima”, “É Tudo Terra”, “Em Águas de Bacalhau”, “Um Mar t’Alimpe”, “Sardinha na Brasa”, “Gente do Mar” e “Cantarinha Vai à Fonte”.
Tudo feito com a prata da casa, da autoria de Vasco da Gama e Jorge Bracourt, musicadas por José Traqueia Bracourt.

Se os êxitos alcançados pela secção cénica se devem aos méritos dos seus amadores, uma parte vai para os ensaiadores, que foram: António Gomes Pinto, Manuel Monteiro, José Gaspar, Constantino Nunes da Silva, António Neves, José Goltz de Carvalho, Mário Santos, António Sousa, Manuel Pereira da Silva, João Alves Fernandes, Severo Biscaia, Eduardo Matos, Jorge Bracourt, José Fernandes dos Santos, Mário Bertô e Dr. António Gouveia de Carvalho.
Fizeram parte da Orquestra do Grupo Caras Direitas, Valentim Oliveira (trompete), António Mendes da Costa (acordeão), Augusto Palas (Sax e clarinete), João da Cruz Dias (Saxofone), António da Cruz Neto (Baterista) e César da Silva Carvalho (Contrabaixo e Vocalista).
Os Vodkas, grupo musical dos anos 60, teve a sua génese na Orquestra Infantil do Grupo Caras Direitas.
Em 1 de Dezembro de 1982 o Grupo Caras Direitas inaugurou um pavilhão gimnodesportivo, onde se realizam várias práticas desportivas, como futebol de salão, ginástica de manutenção, ténis de mesa, tiro ao alvo, petanca, aeróbia e basquetebol feminino.
Nos anos 80 funcionou nos Caras Direitas a Biblioteca Gulbenkian.
O Grupo Caras Direitas é uma entidade de Utilidade Pública, conforme consta no despacho publicado no “Diário da República”, II Série, nº 289, de 16 de dezembro de 1980, uma Associação sem fins lucrativos, Membro Honorário da Ordem de Benemerência, título conferido pelo Presidente da República em 9 de junho de 1982.