A Casa do Paço da Figueira da Foz foi construída, de 1690 a 1704, para habitação de veraneio e descanso de D. João de Melo (1624-1704), 14º conde de Arganil e 49º bispo de Coimbra. D. João de Melo nasceu em Évora em 1624, era filho de D. Jorge de Melo e de D. Maria Madalena de Távora. Morreu na sua Quinta de São Martinho do Bispo, próximo de Coimbra, em 28 de junho de 1704, e foi sepultado na igreja do Convento de Santa Cruz do Bussaco.
D. João de Melo era tetraneto de Simão de Melo, também conhecido por D. Jorge de Melo, bispo da Guarda (1519-1548), que, com uma sua concubina casada, Helena de Mesquita, iniciou a família “Melo”, com o prefixo “Dom”, no norte de Portugal. Foi Bispo de Elvas entre 1671 a 1673, de Viseu entre 1673 e 1684 e Bispo-Conde de Coimbra desde 1684 a 1704, ano da sua morte.
Foi inquisidor, prior na igreja de S. Tiago de Évora e penitente na Serra da Arrábida onde encontrou o rei D. Pedro II durante uma caçada, por volta de 1670. Caindo nas boas graças do monarca foi por ele nomeado Bispo de Elvas, transferido para Viseu em 1673 e em Julho de 1684 toma posse do bispado de Coimbra.
Faleceu a 28 de Junho de 1704 na sua quinta de S. Martinho do Bispo e foi sepultado na igreja do Convento de Santa Cruz do Bussaco. Sobre a lápide do comprido epitáfio no coro da igreja do convento, podemos ler:
Vivo, não morto
Aqui está, não jaz
D. João de Melo
Bispo de Coimbra
Em 1735, o sobrinho de D. João de Melo, o cónego D. António José de Melo e Mendonça (1º morgado da Figueira), institui o morgadio da Figueira que incluía a Casa do Paço, marinhas e terras de cultivo, a favor do seu filho D. Pedro José de Melo Homem (2º morgado da Figueira).
D. Pedro José de Melo Homem casa com D. Maria de Bourbon. A filha deste casal, D. Maria José de Melo Menezes e Silva, casa com D. José Maria Rita Castelo-Branco (3º morgado e 1º Conde da Figueira desde 1810).
D. Maria José não teve filhos e, por sua morte, em 1818, o morgadio passa para o seu irmão, D. Miguel António de Melo e Abreu (4º morgado da Figueira e 1º Conde de Murça).
O morgadio é herdado pelo filho do 1º Conde de Murça, D. José Maria de Melo (5º morgado da Figueira e 2º Conde de Murça).
O 2º Conde de Murça não teve filhos e o morgadio passa para o seu irmão D. João José Maria de Melo (3º Conde de Murça).
Em 1836, Frutuoso José da Silva, negociante de Coimbra, adquire o imóvel.
Em 1861, através de uma escritura de sub-rogação celebrada com o 3º Conde de Murça, o morgadio passa para a sua posse, sendo definitivamente desvinculado dos bens da família Melo.
Em 1868 foi vendido a Manuel dos Santos Júnior, abastado proprietário de Coimbra, que recebe o título de 1º Barão do Paço da Figueira da Foz, em 1881.
A Casa do Paço da Figueira da Foz foi sede de diferentes serviços e instituições, tais como: Teatro (cerca de 1823 a 1860); Assembleia Figueirense (1857 a 1879); Museu Municipal (1894 a 1899); o Grémio do Comércio, a atual Associação Comercial e Industrial da Figueira da Foz (1922 a 2005); Grémio Lusitano (1885 a 1888), Grémio Recreativo (1888 a 1892); Escola Industrial da Figueira da Foz (1894 a 1898); Colégio Liceu Figueirense (1903 a 1906) e Ginásio Clube Figueirense (1914 e 1922 a 1930); o Centro Republicano Dr. José Falcão ou a Associação Instrutiva dos Empregados do Comércio e Indústria.
O arquiteto da Casa do Paço é desconhecido, mas a sua traça é semelhante à de outros edifícios patrocinados pelo Bispo D. João de Melo, nomeadamente o Convento de Santa Clara-a-Nova, em Coimbra, concebido por frei João Turriano (engenheiro-mor do Reino e lente de Matemática na Universidade de Coimbra).
Não foi construída uma torre no lado oposto à torre existente porque a morte de D. João de Melo impediu a sua concretização.
No interior da Casa do Paço mantém-se a distribuição espacial que, no restauro do século XIX, foi copiada da Casa da Baía/Casa da Quinta/Quinta da Corredoira, em Maiorca, que remonta a 1637.
A Casa do Paço tem alçados imponentes, mas é no seu interior que existe a maior colecção de azulejos holandeses em Portugal e o maior conjunto do mundo, cerca de 6700 azulejos de figura avulsa, a decorar as salas do piso nobre, todos diferentes, executados na primeira década do século XVIII, representando paisagens campestres e marinhas, cavaleiros, (príncipes, guerreiros e amazonas) e cenas bíblicas retiradas do Velho e Novo Testamento.
Atualmente são 4 as salas onde se podem encontrar esses azulejos, subdivididos em 3 temas: 2 salas com paisagens, 1 sala com temas bíblicos e 1 sala com cavaleiros. A atual sala da recepção e a sala do torreão já tiveram azulejos que foram removidos em 1865 pela entidade que à época aqui esteve sediada.
As referências mais antigas a estes azulejos datam de 1887, sendo da autoria de Ramalho Ortigão, em “As Farpas”, e de J. F. A., em “Figueira da Foz – O Paço”, na revista O Ocidente, 10º ano, volume X, nº 299, de 11 de abril.
No entanto, é com a monografia “A Casa do Paço da Figueira da Foz e os seus azulejos”, de João Miguel dos Santos Simões, que estes azulejos são, de facto, estudados (edição do Museu Municipal Dr. Santos Rocha, em 1947). Em 2013, um novo estudo da azulejaria da Casa do Paço deu origem a um catálogo editado pela Câmara Municipal da Figueira da Foz em 2014. Em abril de 2015, o jornal A Voz da Figueira publicou também interessantes textos e fotos sobre a azulejaria da Casa do Paço.
Os azulejos foram produzidos em Roterdão, nos primeiros anos do séc. XVIII, na olaria Delftsevaart, e não se sabe ao certo como chegaram à Casa do Paço.
Uma das lendas acerca deste espólio refere a recuperação da carga de uma fragata holandesa que terá aportado ou naufragado junto à foz do Mondego, em 1706, a qual teria sido posteriormente vendida pela Alfândega e adquirida pelos proprietários da Casa do Paço.
Outra hipótese, é terem sido encomendados por D. Pedro de José de Mello, sabendo que comprou mais de 5000 azulejos holandeses idênticos para decoração da sua casa de Lisboa (Palácio Melo e Abreu/Hospital dos Capuchos), que adquiriu em 1718.
Na Casa do Paço realizaram-se inúmeros eventos que fazem parte da história da Figueira da Foz, nomeadamente:
• Em 22 de agosto de 1757, esteve na capela da Casa do Paço, num batizado, o então Secretário de Estado dos Negócios do Reino, Sebastião José de Carvalho e Melo (Conde de Oeiras em 1759 e Marquês de Pombal em 1770), onde foi padrinho, por procuração, do filho do então Governador das Praças de Buarcos e Figueira, José Pacheco D’Albuquerque e Melo, fidalgo da Casa Real, casado com D. Anna Joaquina D’Azeredo.
• Em 1823, no piso térreo, do lado do rio, foi representada a 1ª peça de teatro na Figueira da Foz, a «Nova Castro»; posteriormente, em 1860, um incêndio destruiu o teatro instalado na Casa do Paço.
• Em 3 de agosto de 1882, o rei D. Luís e D. Maria Pia vêm à Figueira da Foz inaugurar a Linha da Beira Alta, tendo sido recebidos na Casa do Paço.
• A 6 de maio de 1894, é inaugurado, por Santos Rocha, o Museu Municipal, no piso nobre da Casa do Paço; este Museu foi transferido para o edifício da Câmara Municipal em 1899.
O edifício da Casa do Paço foi classificado como Imóvel de Interesse Público em 1967 (Decreto n.º 47 508, DG, I Série, n.º 20, de 24-01-1967).
N.R. – O imóvel pertence atualmente ao Município, albergando, entre outros serviços e comércios, a sede da Associação Comercial e Industrial da Figueira da Foz.